A internet mudou a forma como marcas e consumidores se relacionam, e isso é inegável. No entanto, em meio a tantas ferramentas digitais, o Reclame Aqui ocupa um espaço curioso — quase intocável — como se fosse o único caminho válido para o diálogo com o cliente insatisfeito. Mas essa hegemonia, vista por muitos como oportunidade de ouro para demonstrar transparência, pode estar escondendo um risco sério: o desgaste crônico da imagem da empresa diante de um público cada vez mais condicionado a reclamar antes mesmo de tentar uma solução.
Para gestores de marketing atentos, a dinâmica do site já não soa tão justa. Marcas que respondem, resolvem e acompanham ainda assim seguem expostas, rotuladas e vinculadas a palavras-chave negativas nos buscadores. A recompensa pelo bom atendimento? Uma repetição infinita de visibilidade tóxica. E quanto mais ativa a empresa for na plataforma, maior o risco de se tornar sinônimo de problema — mesmo que os problemas tenham sido solucionados com excelência.
Outro ponto negligenciado por muitas empresas é o comportamento que a plataforma acaba estimulando. Quando um consumidor percebe que basta uma queixa pública para conseguir um atendimento mais ágil, é natural que use essa ferramenta como primeiro recurso — ou até mesmo como estratégia. Surge, então, um tipo de chantagem emocional disfarçada de direito do consumidor. E embora nem todos ajam de má-fé, a repetição desse padrão cria um ambiente viciado, que desgasta relações e desvaloriza os canais institucionais.
Esse ciclo de exposição e resposta tem consequências reais. Além da indexação negativa nos mecanismos de busca, há o desgaste das equipes que precisam lidar com uma vitrine permanente de crise. E isso contamina o clima organizacional. A energia que deveria ser dedicada à inovação, à experiência do cliente e ao crescimento é desviada para administrar o que, muitas vezes, poderia ter sido resolvido silenciosamente — e de forma mais eficiente — por um canal interno bem estruturado.
Não é à toa que cresce o número de empresas optando por não responder mais no Reclame Aqui. Essa decisão, longe de ser irresponsável, parte de uma leitura fria e estratégica: se o canal alimenta uma reputação negativa, por que continuar participando dele? Fortalecer SACs próprios, investir em ouvidorias e promover um atendimento humano fora das vitrines digitais pode ser, paradoxalmente, o caminho mais saudável para proteger a marca.
Esse comportamento empresarial também coloca em xeque o futuro da plataforma. Afinal, sem a resposta das marcas, o Reclame Aqui perde sua razão de existir como espaço de resolução. Reclamações unilaterais, sem contraponto, não geram engajamento — nem nos usuários, nem nos algoritmos. Isso reduz sua relevância nas buscas e, consequentemente, seu valor de mercado. Um sistema baseado em resposta não sobrevive se as respostas cessam.
Fica então a reflexão final: empresários e líderes de marketing devem questionar até que ponto vale a pena seguir alimentando esse ciclo. Será que estar no Reclame Aqui ainda é sinônimo de transparência, ou já virou uma armadilha reputacional? Talvez o verdadeiro diferencial esteja em resgatar o controle da comunicação e priorizar relações menos expostas — e muito mais eficazes — com seus públicos. Quando as empresas deixam de responder, o site perde força. E se ele não aparece, também deixa de manchar.
Autor: Vyacheslav Gavrilov